29 de jun. de 2021

O comunista do Café Rian


Já passava brincando metade da década de 60, quando fui apresentado às colunas do Café Rian, térreo do Edifício Santa Cruz ali na Rua da Praia em Porto Alegre,  local frequentado por jornalistas, políticos, profissionais liberais, jogadores de futebol, estudantes e uma boa parte da burguesia  que fazia questão de passar por lá só pra ser notada por algum colunista ou jornalista novato que sem matéria usava a aparição para promover o nome.

Eu, rapazote  com pouco mais de 12 anos, viajava para capital durante as férias de verão e fazia pousada no apartamento de meus tios, ela professora do estado, ele economista do Deprec e professor na PUC-RS. Um casal sem filhos que dividiam o pequeno apartamento da rua Vasco Alves, 229 - entre as ruas Riachuelo e Andradas, centro histórico da capital gaúcha - com sua mais que secretária, Divah, que os serviu até o fim da vida. 

Era uma habitação pequena com cozinha, dependência de empregada com banheiro, sala, quarto, biblioteca e banheiro social com banheira e junker a gás, coisa fina pra epóca. Ainda tinha uma pequena área de serviço ao lado da cozinha onde podia-se ouvir as conversas dos vizinhos e espiar o edifício ao lado. 

Eu dormia na biblioteca. Improvisava a cama em uma poltrona reclinável que meu tio usava para ler seu livros e organizar suas coleções. Ele adorava livros! Tinha uma curiosidade intrínsica sobre tudo  pesquisando a fundo qualquer assunto só para ter argumentos e fundamentos para discutir os arrancarabos da época com os colegas da repartição. Colecionava selos, moedas, discos e vinhos portugueses, comprava todas  as revistas e jornais, estava sempre bem informado. 

Na sala um sofá de canto forrado com um plástico transparente, onde não se podia por os pés, tinha uma mesa com tampo em mármore e no canto da sala, em frente, uma tv Philco Predicta última geração, que nos passava as informações do mundo pelos dois canais disponíveis, TV Piratini canal 5, Rede Tupi naquele tempo ou TV Gaúcha canal 12 afiliada a TV Excelsior. 

Eu amava o conforto daquele lugar, as coisas todas em seu lugar, o cheiro dos livros o reflexo da luz nas lombadas multicoloridas o perfume da cola dos selos, a comida feita por Divah e o silêncio que só era quebrado pelo zunir dos bondes que freavam na curva da rua Gen Salustiano logo abaixo dos fundos do apartamento de onde da janela da biblioteca tinha-se uma visão completa da Usina do Gasômetro e sua magnífica chaminé. 

No mais tudo era paz. Meus tios tinham uma preocupação com o bem estar dos vizinhos, nossas conversas eram aos cochichos, eu não entendia bem o porquê. caminhava-se nas pontas dos pés, arrastar uma cadeira nem pensar... Manias! Um dia entenderia...

...continua

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